terça-feira, 8 de abril de 2008

Temperando a vida, com Lenir Camimura

Que difícil lição tiramos da vida: o relacionar com o outro pode ser uma verdadeira armadilha...ou um prazer inconfundível. Nem oito e nem oitenta, nem tanto ao mar, nem tanto à praia. Um tanto de flexibilidade e tudo se ajeita. Ajeita?
Tenho pensado se a celebração da simplicidade se aplica aos relacionamentos. Sujeitos complexos que interagem não podem esperar nada mais do que complexidade neste encontro. Se fosse tudo tão simples, tão arroz com feijão, que graça teria? Se alguns dias não saboreássemos deliciosas sobremesas de chocolate ou provássemos o amargor do jiló, não saberíamos a diferença entre o bom e o ruim. Verdade?
O fato é que mesmo o simples arroz, que pode ficar pronto em 20 minutos, passado do ponto, queima e traz o amargor ao que antes tinha um sabor peculiar e deliciosamente conhecido. Relacionamentos são como o prato apreciado por brasileiros e japoneses. Cada um a sua maneira, com um deslize - minha mãe sempre diz que comida a gente faz é na cozinha. Se vc sair, o arroz VAI queimar - você pode arruinar toda uma panela de dois copos do grãozinho branco.
E o que fazer depois do estrago? Corre com a panela para a pia, cobre com um pano, esfria o fundo do recipiente, põe uma colher no meio pro mal cheiro sair....seja lá qual for sua receita, uma coisa é real: não será mais o mesmo. Mas ainda serve para comer. Se o tempo de cozimento ultrapassou dois minutos. Se passou cinco, desista e comece tudo outra vez.
Ok. Não estamos aqui para fazer um curso de culinária on line. Mas a metáfora é verdadeira. Relacionamentos funcionam como nosso prato típico. Mas o cozimento é intermitente. Enquanto não desviamos o olhar da panela, tudo vai bem e sabemos que o desenrolar será proveitoso. Basta uma corridinha ao armário para buscar um prato para a salada e tudo foi para o espaço (estou voltando à metáfora...).
A diferença entre nós e a comida é algo que estou lendo a respeito: graça. O arroz, se perdido, perdido está. O relacionamento, não. Somos movidos por emoções, sem esquecer, claro, da razão. Mas o deslize, podemos perdoar. Não, não estou simplificando o complexo. Continua sendo complicado reconhecer, arrepender, corrigir, expor-se e perdoar. Mas temos acesso a este benefício por meio de Jesus. Escrevo para nós da comunidade. Sabemos do que estou falando. Não preciso entrar no mérito teológico da graça.
Mas estive pensando e chorando sobre este assunto. A graça se aplica ao que consideramos injustiça. O perdão de um assassino, a salvação de um perdido, o amor - incondicional - ao odioso. Nós éramos o que mereciam justiça. Praticamos o mal, mas recebemos o bem. E, agora, me ocorre que, muitas vezes, criticamos nossos "irmãos" que correm para o trono para receber (principalmente quando se trata de dinheiro) e correm no sentido contrário se é para dar (pergunte aos tesoureiros das missões e das igrejas...), mas fazemos o mesmo com a graça.
Como dizia a música cantada pelo CCU, "I'm running to the mercy seat", mas não me peçam para compartilhar desta graça. Estou apontando para mim mesma. Quantos relacionamentos eu permiti que se partissem, que se tornassem mal-cheirosos como o arroz queimado, ao invés de tomar a iniciativa e, com humildade e obediência, chorar o perdão: ou ao outro ou para mim?
Nosso orgulho nos impede de voltar atrás, de ir contra a expectativa da justiça. Nos fizeram mal - este é o decreto -, eles que paguem. Ainda que isso signifique morrer aos poucos e a cada dia. Não temos uma reserva de graça. Engordamos dela e quanto mais obesos melhor. Entupimento das veias por excesso de graça? Parece ridículo.
"Misericórdia quero e não holocaustos". Fazemos muito, somos pouco. Não importa, sinceramente, se o outro terá a mesma reação. O processo da graça começa é em mim. Não posso esperar que vocês me acompanhem. Cada um no seu tempo, cada um a sua maneira. Meu arroz é temperado só com sal. E não fica sem-graça (sem trocadilho, mas é isso mesmo). Se o perdão vai ser o sal para os meus relacionamentos, não posso me esquecer de colocá-lo, então. Comida insossa é intragável e, meus amigos queridos, não pretendo mais perder o banquete.

3 comentários:

Larissa Sales disse...

hum... sim, levantei os pés...no último episódio levantei os pés e te confesso que fui quase bem alto. Mas rapidinho aterrizei.
Desculpe, o último episódio da última temporada só poderá ser divulgado quando a próxima temporada terminar de ser escrita. É pra dar continuidade. rs... ou não. Mistério.
bjiim.
ps: saudade de você guria!

Larissa Sales disse...

nossa amiga! que post emocionante!
amei! Jamais o delete ok?! Quando eu esquecer como se faz, vou dar uma lidinha nesse "guia da culinária da vida" ;)
bju

Unknown disse...


rs

Não sou muito paciente com a culinária da metáfora. Arroz passado ou queimado eu jogo fora. Não gosto muito de pensar sobre isso, mas sou um serial killer nos relacionamentos: pisar na bola comigo é o mesmo que assinar o próprio atestado de óbito. Mas enfim. Nem reflito se isso tá (muito) em mim, mas, caso esteja, estou disposto a ser moldado na Olaria do Senhor... rs


beijos, ótimo texto!
ricardo