Abri os olhos e me deparei comigo mesma. Olhei o reflexo estampado no rosto cansado impresso no espelho e não reconheci aqueles olhos sem cor. De onde vieram aquelas rugas? Por que a profundidade daquelas olheiras? Onde estava a esperança que antes neles se refletia?
Perdi algum tempo naquele contemplar, mas sem encarar com firmeza aquele esquálido fantasma. Sobrevivente de 2009. Foi o que pensei. A dureza dos problemas, às vezes insanos e às vezes menos problemáticos do que de outros, me transformaram neste ser desfigurado, irreconhecível e desprezível.
Não conhecia mais as curvas do meu próprio rosto e desenhei na memória o sorriso que antes encantava e iluminava o meu ser. Não era eu a mesma de janeiro passado. Não era meu semblante de alguém que queria viver.
Reli os textos pra ver se me lembrava de mim. Me investi em uma pesquisa externa pra descobrir onde meu verdadeiro "eu" havia desaparecido. Sem respostas, me entreguei ao cansaço da perda própria e me esqueci, enterrada no abismo da superficialidade mal-resolvida.
Não quis - como ainda não quero - ir atrás de mim. Não tenho forças para sair do escuro e deixar que a luz me veja. A minha cama armei no profundo abismo, me escondendo de mim e de você.
Estampei um sorriso amarelo, apertei as amarras da máscara mentirosa e chamei de "eu". Apresentei a versão mais vulgar e insana de mim. Deixei que pensassem que meu nome era grandioso e competente. Deixei que minha reputação se atrelasse a um impostor interno, maquiavélico, criado pelo meu desgosto.
E assim, en passant, todos se orgulhavam de quem me fiz. Todos me aceitavam com louvores. Todos me olhavam com admiração. Todos contavam comigo para garantir seu sucesso. Todos menos eu. A única que, de fato, conhecia as agruras e podridões que haviam transformado e deformado minha face, frente à orgia de mentiras em que havia sucumbido.